Sabes que estás a ficar velho quando gostas de ver The Crown
Se tens mais de 40 anos não há problema em admitir que gostas de acompanhar a evolução da Rainha Isabel II em The Crown, a série da Netflix premiada com um Emmy na categoria Melhor Drama. Se estás na casa dos 20 ou 30 anos e dás por ti a querer ver vários episódios desta série, temos de avisar que estás a envelhecer… mas bem, não te preocupes.
É sinal que estás a amadurecer e isso reflete-se na forma como consomes os teus produtos de entretenimento. É por esta altura que começamos a dar valor aos diálogos em vez da ação, à construção das personagens invés às juras eternas de amor, preferindo dilemas políticos reais a lutas entre Dragões e caminhantes brancos [foi só uma oportunidade para dizer que também adoramos Guerra dos Tronos].
A série original da Netflix, The Crown, centra-se na história da Rainha Isabel II, recém-casada e ainda com 25 anos, que enfrenta a assustadora perspetiva de liderar a monarquia mais famosa do mundo, enquanto forja um relacionamento com o lendário primeiro-ministro, Sir Winston Churchill. O império britânico está em declínio, o mundo político está em desordem e uma jovem mulher assume o trono... Uma nova era está a surgir.
Há que destacar a atuação de Claire Foy (vencedora do Globo de Ouro de melhor atriz em série) como jovem Rainha Isabel II, sabendo segurar as pontas de uma série que parece que vai cair no aborrecimento a qualquer momento. Com um olhar ou expressão ela consegue dizer três ou quatro frases. É sobre a palavra aborrecimento que queremos falar, porque The Crown tem de ser catalogada como “parada”, não esperem daqui cenas de ação ou recordações da II Guerra Mundial, mas é mesmo aqui que consegue destacar-se. Daí termos dito aquilo do amadurecimento, que nada tem a ver com a idade [aquilo lá em cima era só para ter uma entrada engraçada e segurar mais leitores para chegar até aqui], esta série é para o público mais maduro em relação aos produtos audiovisuais, para aqueles que desfrutam de um bom confronto verbal e de tomadas de decisões que parecem pequenas, mas que influenciaram o curso do nosso mundo.
Além da Rainha Isabel II e o marido Filipe, Duque de Edimburgo - que traz uma perspetiva real do que é estar casado com uma mulher que é também uma das mais influentes do mundo - a série consegue distribuir um papel relevante a personagens que nos pareciam mais secundárias, como é o caso da rebelde irmã Margarida, encarnada pela atriz Vanessa Kirby, que brevemente iremos ver no novo filme da saga Missão Impossível. O trama paralelo dos conflitos da Rainha com o marido, irmã e futuro cunhado são dilemas inteligentes e muito bem construídos pelo argumento. Se há alguém que sabe juntar tramas monárquicos e políticos é o criador da série, Peter Morgan, conhecido por escrever os filmes A Rainha (2006), Frost/Nixon (2008), O Último Rei da Escócia (2006). Também escreveu um filme sobre rivalidades que, apesar de bem recebido pela crítica, não foi um caso de sucesso, falamos de Rush - Duelo de Rivais (2013).
Por falar em rivalidades, Claire Foy teve de se impor, ferozmente em plano de interpretações, a John Lithgow, que encarna o mítico presidente inglês Winston Churchill, ele que levou o Emmy de melhor ator na categoria de drama. Churchill é uma personagem que facilmente tende a cair no exagero, mas, uma vez mais, o argumento segura as pontas e oferece uma humanidade importante à pessoa, indo de acordo com o tom da série.
The Crown é uma série arrumadinha, sem falhas, e é a mais cara de sempre, pela meticulosidade nos detalhes do palácio de Buckingham e não só.
Há duas temporadas disponíveis no catálogo da Netflix, cada uma com dez episódios de aproximadamente 60 minutos.